sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Amor pelos livros

Oi, gente...
Infelizmente, hoje estou sem tempo para escrever sobre um livro muito legal que descobri há poucos dias...
Como não queria ficar sem postar nada, me lembrei deste belo conto da Heloísa Seixas, que recebi com o material do curso Mediadores de leitura para o ensino fundamental (que iniciei na UFPR na semana passada).
Desfrutem-no!
Um beijo e até a semana que vem.

 

Irmãos
Heloisa Seixas

Imaginem um menino. Um menino qualquer, nem gordo nem magro, nem alto nem baixo, nem bonito nem feio, mas de uma inteligência aguda e de olhos bem grandes, abertos para o mundo, todos os mundos. Ele era assim. Filho único, era capaz de ficar horas a fio trancado no quarto lendo, pois tinha nos livros seus grandes companheiros. Não que fosse um menino solitário, isto não. Tinha amigos, jogava bola, namorava. Mas ler era um prazer especial, que desfrutava com avidez.
Começara com Alice, mas logo enveredara por outros mundos, igualmente fantásticos, para os quais se transportava. Tarzan, a feiticeira Ela, Sherlock Holmes, tantos, tantos. Em seu quarto, armara uma pequena estante, que em pouco tempo já estava superlotada de livros. Romances, poesia, biografias, dicionários, tudo. Tratava os livros com reverência, sem que nunca ninguém lhe ensinasse a agir assim.
Com o passar dos anos, sua vida foi mudando. Cresceu. Mudou de casa, de cidade, de país. Foi e voltou, casou e descasou, ganhou e perdeu, rolou e rolou pela vida como quase todos nós e, com essas transformações, sua biblioteca de menino foi desaparecendo. Mesmo os livros mais antigos, os primeiros, aqueles que mais amava e dos quais se recordava de forma aguda, se perderam.
Novamente, os anos passaram.
Até que um dia, muito tempo depois, estava ele num sebo, examinando aquelas prateleiras coloridas que transpiram vida - como sempre acontece com as prateleiras de um sebo -, quando seus olhos se prenderam a uma lombada. Sentiu uma onda de prazer, o reconhecimento imediato. Alcançou o livro e puxou. Viu-se com um pedaço da própria infância nas mãos. Era um exemplar igual - mesma capa, mesma editora, mesma edição, tudo - ao que tivera em criança. Folheou as primeiras páginas imaginando encontrar seu próprio nome escrito a caneta-tinteiro (pois sempre escrevia o nome nos livros), mas o que encontrou foi outro nome. De outro menino, quem sabe igual a ele, apaixonado por livros. Porque os meninos apaixonados por livros tratam bem seus volumes e aquele estava muito bem conservado.
Daquele dia em diante, não parou mais. Passou a andar pelos sebos buscando seus livros de infância. Tinha a secreta esperança de um dia abrir um deles e encontrar o próprio nome, mas isso nunca aconteceu. Não se importou. Encontrava outros nomes e sentia-se irmanado àqueles que um dia foram meninos como ele e que, como ele, amaram os livros desde cedo. E foi assim que esse menino-homem, sendo filho único, ganhou dezenas de irmãos.


SEIXAS, H. Uma ilha chamada livro: contos mínimos sobre ler, escrever e contar. Rio de Janeiro: Galera Record, 2009.


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